NOTÍCIASÚLTIMAS NOTÍCIAS

BRASIL À BEIRA DO CAOS

É muito preocupante a situação do Brasil. Vítima de uma corrupção endêmica, a tentativa de curá-lo pode precipitar seu estado deveras crítico. De algum modo, entendo agora o grito do ex-presidente Lula e de outros combativos do juiz Sérgio Moro: o Brasil estaria sofrendo prejuízos com a operação Lava Jato, sim, pois o remédio necessário pode virar veneno.

Aos poucos, vamos concluindo que não vai sobrar ninguém, não vai sobrar Câmara, não vai sobrar Senado, não vai sobrar governo e, se as investigações tiverem força e independência, talvez também não sobre o Supremo, pelo menos parte dele.

O Congresso Nacional está demonstrando por que existe, está revelando que, exceções à parte, candidatos eleitos não estão a serviço do povo, mas de si mesmos: de suas empresas, de suas famílias, de seus amigos, das pessoas influentes das comunidades que os elegeram. É assim que um projeto de iniciativa popular com dez medidas contra a corrupção é manietado e morto de madrugada, é assim que homens vis se apropriam da lei e zombam do povo. Isto foi a gota d’água. Assistimos a uma zombaria da opinião pública, ao último estágio de uma barbárie política apelidada de democracia. Isto acontece quando pessoas eleitas pelo sufrágio universal zombam de seus próprios eleitores.

Olhe o nosso estado: gente importante do antigo governo está presa, a presidente foi deposta, Eduardo Cunha está preso, empresas de envergadura nacional estão envolvidas na corrupção, delações ameaçam entregar mais e mais e mais. Agora, mal acabaram as bodas do governo Temer, e já caem dois ministros. No Senado, temos um presidente com uma penca de inquéritos e ações no Supremo, alguém que, depois da eleição do cantar do galo na Câmara, queria dia seguinte que o projeto anticorrupção fosse votado em regime de urgência.

Difícil a situação do Brasil! Para seguir avante com a Operação Lava Jato, precisa de instituições fortes, um parlamento forte, um presidente firme, uma alta corte limpa. Mas, o que temos? O que temos é o fechamento do cerco contra líderes parlamentares importantes e uma força centrífuga que puxa todos, senão, quase todos, ao olho do furacão da Lava Jato.

Precisaríamos mesmo de um STF combativo da praga da corrupção, porém, não vemos isto, não. O Supremo permanece intocável, recoberto por um véu que algum dia tem de cair, pois, ali deve ser a casa da transparência. Afinal de contas, por que o Supremo não dá exemplo de presteza jurisdicional quanto às ações envolvendo políticos? Por que leva anos para julgá-los? Por que nunca prendeu sequer um, ao passo que um juiz singular do calibre de Sérgio Moro está a perder de vista quantos já prendeu? Por que o Supremo deixa processos prescreverem em suas gavetas secretas?

Vejo com muita cautela a situação do Brasil. Eu me pergunto: Se o Renan Calheiros cair, quem será o próximo? Se o presidente Temer fosse afastado, quem assumiria? Até aonde iremos nesta luta para encontrarmos um político de mãos limpas neste país? É complicado pensarmos em mover o atual presidente. Porventura, existe um limite para se investigar e punir o mal? Politicamente, não sei, mas estamos entrando num caminho sem volta, parece que estamos sim.

Ficamos impressionados com a demonstração de frieza política de muitos desses cidadãos parlamentares. Alguns perderam a vergonha. Alguns agora agem em causa própria escrachadamente. Ora, o projeto de lei anticorrupção existe por causa dessa desgraça que assola nossa nação. Como pode uma Câmara fazer o que fez conosco? Como pode votar algo assim enquanto a população dormia e muitos soluçavam com a tragédia dos jogadores? Como pode o Senado receber esse projeto adulterado pela Câmara e, ignorando o respeito, querer votar essa lei a toque de caixa? O que é isso?

Para mim, os gestos da Câmara e do Senado, na pessoa de seu presidente e de seus pares, são um grito de desespero por si mesmos. Mas, são também um grito para nós, um grito que nos avisa que mesmo toda a Operação Lava Jato não tem o poder de tocar na extensão da ferida mortal deste país. O grito é para nos dizer que a ferida tem oito milhões de quilômetros quadrados. Para nos dizer que o Brasil pode “morrer” se o necessário remédio continuar sendo derramado sobre essa chaga cancerígena do jeito que está sendo.

Talvez essa tentativa de curar o país tenha de ser feita por etapas. O doente precisa respirar. É preciso montar boas estratégias, saber o quê e quando ministrar a droga curadora. Pacientes graves precisam ser sedados. O Brasil assiste, vivo, à extirpação de seu tecido social. O que outrora era considerado vital, agora sabemos, é maligno.

Rui Raiol é escritor
Publicado em O Liberal – 06 de dezembro de 2016
Site: www.ruiraiol.com.br