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Artigo: “A pergunta de Moraes a Mendonça”

Assistindo ao julgamento do STF que discutia o indulto concedido ao ex-deputado Daniel Silveira, chamou-me à atenção a intervenção do ministro Alexandre de Moraes ao igual ministro André Mendonça. Enquanto lia seu voto, Mendonça foi questionado sobre dois pontos que acabavam de ser argumentados: a repercussão contrária à prisão de Silveira à época do fato e a formação jurídica de alguém que escrevera discordando também da medida coercitiva.     Confesso que saltou aos olhos a inconveniência da pergunta. Muito embora eu não haja lido o regimento interno do Supremo, não precisamos dessa leitura para concluir que não existe hierarquia entre os ministros da corte no exercício de seu mitiè. Por isso, julguei indevida a conduta do ilustre ministro Alexandre de Moraes , sobretudo porque o notável criminalista é deveras antigo no tribunal, ao passo que Mendonça, recém-chegado. A resposta educada deste não era obrigatória, posto que não cabe a qualquer ministro questionar elementos que formam a convicção de seu voto. No máximo, cabe à presidência da corte tirar dúvidas quanto à classificação e à pena aplicável. Pari passu, o voto nos colegiados jurídicos conserva a mesma inviolabilidade de opinião e convicção que têm os votos depositados em urnas eleitorais. Mesmo proferindo seus votos em sessão aberta, é inviolável o direito de cada ministro e correlatos de exercerem esse sagrado direito. Embora proferidos em ambiente público, e devidamente explanados, argumentos e convicções são de foro íntimo e personalíssimo.    Em aspecto amplo, o STF foi afetado ali pelo germe do excesso de zelo, fato muito comum na esfera administrativa, ocorrendo quando alguém, movido por boas intenções, exagera na sua conduta protetiva do Estado, chegando com isso até prejudicar direitos de outrem. De quando em quando, o TCU admoesta administradores públicos a não agirem com excesso de cautela. No fato em análise, penso que Alexandre de Moraes, cem por cento convicto de que o ex-presidente Jair Bolsonaro exorbitou de suas prerrogativas ao conceder indulto “preventivamente” a Silveira, tinha na reunião do STF ouvidos cerrados a qualquer argumentação contrária, o que não é bom ao espírito democrático que deve governar também o Supremo Tribunal Federal.     Não é excessivo lembrar que a capacidade de ouvir opinião diversa é um grande exercício dialético. Todas as democracias fortes estão assentadas sobre esse fundamento. No tocante ao Supremo Tribunal Federal, cada membro é um juiz de per si. O colegiado advém da reunião de onze pessoas escolhidas segundo os mesmos critérios constitucionais. É uma força representada pela pluralidade, sendo a unanimidade de pensamento em fato concreto um fenômeno jurídico e democraticamente tão importante quanto ao conflito de teses na corte.

Rui Raiol é escritor 

Publicado no jornal O Liberal em 13/6/2023

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