Artigo: “Aprendendo com os pássaros”
Fico impressionado com a tendência que temos de viver focados na linha horizontal da Terra. Muito embora estejamos sobre um imenso globo flutuante, a luta diária, as paixões e anseios nos empurram gravitacionalmente para baixo. Então, sem essa devida percepção cosmológica, construímos castelos sobre a areia movediça do tempo.
De todos os animais que habitam a Terra, os pássaros são para mim o maior exemplo de liberdade, dependência de Deus e interação com o planeta. Quem vive na Amazônia não precisa ir a um jardim botânico para observá-los. Como sentinelas enviadas pelo Criador, eles estão por toda parte a nos vigiar. Do nascer ao pôr do sol, os pássaros nos lembram incessantemente como devemos ser alegres e confiantes, apesar da brevidade da vida.
Se hoje podemos voar, isso se deve ao nosso conterrâneo Júlio César Ribeiro de Souza, um caboclo de Acará, que, em 8 de novembro de 1881, decolou seu aeromodelo em Paris. Foi observando o voo dos pássaros no interior do Pará que o nosso herói decidiu estudar a ciência aeronáutica.
Os pássaros são livres e verdadeiros observadores do nosso planeta. Com sua aerodinâmica perfeita, podem atravessar uma cidade rapidamente, sem enfrentar o trânsito caótico que os seres proclamados superiores construíram e administram.
Onde moram os pássaros? Não sabemos ao certo. Quando o crepúsculo chega, obedientes, eles procuram um abrigo seguro. Não ficam perambulando durante a escuridão. Depois da tarefa do dia, a noite é uma hora sagrada de repouso. Provavelmente fugindo de predadores, pássaros que vivem perto do perímetro urbano passam o dia nas matas, mas dormem na copa das árvores das cidades. Eles observam a lei da vida melhor do que muitos de nós.
Não faz muito tempo, descobri que um Tem-tem dormia em um mamoeiro no quintal de casa junto à sacada do quarto, o que me permitia observá-lo bem de perto. Próximo das seis da tarde, ele chegava para se abrigar debaixo da folha mais perfeita. Sob aquele guarda-chuva natural, dormia a noite inteira. Durante madrugadas tempestuosas de Belém, preocupado, eu me levantava para observar se ia tudo bem. Estava lá, quietinho, sereno!
Os pássaros vivem e dormem sob o céu. Não edificam abrigos férreos. São capazes de tecer suas casas simples e proteger seus filhotes em meio às intempéries do clima. Quando o Sol lança seus primeiros raios, os pássaros nos acordam em festa. Eles anunciam com seus belos cânticos diversos que nasce para todos os seres uma nova oportunidade. Eles nos despertam com essa sinfonia, querendo nos lembrar que, apesar das incertezas do dia nascente, o fato de estarmos aqui é o maior de todos os milagres e um motivo certo de celebração.
Os pássaros nos ensinam que a vida é sempre diária. A natureza é o único oráculo que consultam. Quando o Sol desponta no horizonte, eles lançam-se ao mundo à procura de alimento e, porque se sentem livres para procurá-lo, podem ser conduzidos pela Providência ao lugar certo. Não têm apartamentos, carros, planos de saude ou qualquer outro bem reputado essencial para os homens. Eles têm apenas a vida e, para mantê-la, dependem exclusivamente de Deus.
Aprendamos com os pássaros a depender cada dia de Deus. Quem nos deu a vida e nos fez existir, também pode cuidar da gente. Sejamos alegres, agradecidos e trabalhemos. Como disse D. W. Moody, pastor americano, trabalhemos como se tudo dependesse de nós e oremos como se tudo dependesse de Deus. Desse binômio, virá a paz.
Rui Raiol é escritor
Publicado no jornal O Liberal em 14/06/2022
E-mail: ruiraiol@gmail.com