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O “fermento” evangélico de Bolsonaro

Desde que o então eleito Presidente Jair Bolsonaro deu um chega-prá-lá em Magno Malta, senador que não se reelegeu, a mensagem foi dada: Bolsonaro quer distância de alguns políticos evangélicos. Na ocasião, Silas Malafaia insistiu que ninguém estaria mais capacitado a representar o governo em Israel, mas nada adiantou para o capitão: Magno Malta voltou para a sua música ou a qualquer outra coisa longe de Brasília.
Agora, é o deputado Marco Feliciano quem reclama. Em sua conta no Twitter, Feliciano escreveu na sexta passada: “Ou vocês criam um grupo político e intelectualmente preparado ou todos os dias irão sangrar”. Afinal, o que buscam tais políticos evangélicos e alguns apoiadores religiosos de Bolsonaro? Feliciano afirmou que “a comunicação está péssima” com o Presidente.
Essa mesma “falta de comunicação” foi uma das causas indiretas do impeachment de Dilma. Dilma não fez caso da bancada evangélica. Silas Malafaia bem tentou, mas também nunca teve o prazer de posar ao lado da Presidenta no Planalto. Resta saber se Silas e outros religiosos adotariam a postura contundente contra o governo do PT, caso a recepção fosse outra. Eu tenho certeza que não.
Por sua vez, Bolsonaro, com seu discurso afiado contra corruptos, não é ingênuo para deixar de perceber que há algo de podre em certos pastores famosos que o apoiaram. Afinal, como enriqueceram tanto? Por que lutam pelo poder? O Presidente já deve ter notado que muitos de seus articuladores evangélicos na campanha não estão nem um pouco interessados na evangelização do País, porém, em aumentar seus impérios pessoais e, para isto, querem uma ajudazinha do Estado, uma alavancada, na verdade.
Parafraseando o que Jesus disse acerca dos fariseus e a pureza da vida religiosa, para governar bem, Bolsonaro terá de se livrar também do fermento político evangélico no Congresso, e isso com muito cuidado, senão seus antigos articuladores trabalharão a sua queda. Daí, não se impressione se as igrejas evangélicas brasileiras mudarem o discurso mais tarde, passando a pedir que não votemos mais em Jair Bolsonaro.

Toda a questão levantada neste artigo seria evitada se cada segmento se mantivesse fiel à sua vocação. Político devia cuidar de política e religião cuidar de religião. Misturar estas coisas traz prejuízo a ambos: a religião seculariza-se e ministros religiosos perdem a autoridade espiritual, não tendo doravante isenção para proclamar o Evangelho a todos, inclusive aos políticos. Comprometidos, não serão ouvidos mais pelo mundo e tampouco pelos seus aliados políticos.

O Estado deve e precisa ser laico, isto é saudável para ambas as partes. Cabe a igrejas e sacerdotes exercer o papel de luz e sal na terra. A voz da Igreja deve ser pelos valores espirituais, morais e éticos, e isto sem nenhum vínculo institucional com o Estado. Cabe à Igreja trabalhar a cidadania celestial e terrena dos crentes, fugindo da tentação de dever algum favor a “César”.

Rui Raiol é escritor.

(Site: www.ruiraiol.com.br)